Melhor que a encomenda

No que diz respeito ao desempenho, a economia do país em 1999 saiu-se melhor do que a encomenda. A julgar pelas projeções sombrias que podiam ser feitas no final do ano passado e, sobretudo, pelo início de pânico que se seguiu à flutuação do dólar em 15 de janeiro, o que de fato aconteceu pode ser considerado uma vitória.
Desde o final de agosto/98, quando a Rússia anunciou sua moratória unilateral e provocou imediata retração do mercado financeiro internacional em relação aos países carentes de recursos externos para o fechamento de suas contas, o Brasil assumiu o lugar de “bola da vez” da crise mundial. Durante os meses de setembro a dezembro, com a eleição presidencial no meio, observou-se a crescente sangria das reservas cambiais (tida como a principal garantia do real forte) que passaram de cerca de US$ 70 bilhões para menos de US$ 40 bilhões no dia do fechamento do acordo com o FMI em 13.11.98. Não fosse esse acordo, fechado em tempo recorde num misto de eficácia da equipe econômica e sorte, nossa crise poderia ter ganho conotações bem mais dramáticas conforme antecipara o desfecho da crise russa…
Mas, apesar do acordo fechado com o FMI não prever desvalorização do real, o mercado continuou testando a capacidade do governo sustentar a taxa, o que deu continuidade à sangria das reservas até que, com a declaração de moratória da dívida de Minas Gerais, após a posse de Itamar Franco, a posição do Banco Central ficou insustentável, foram gastos mais cerca de US$ 10 bilhões, Gustavo Franco caiu e o câmbio flutuou. O ano começava ameaçador…
A partir daí, com a demolição de um dos principais pilares do Plano Real (a chamada âncora cambial), explodiram as previsões catastróficas. A inflação iria pipocar (50% ao ano), o dólar ficaria em R$ 2,34, a recessão seria de 4% em 99. Com base nas piores possibilidades, vários cenários se desenharam. O mais preocupante neles era a evidência de que se a inflação retornasse, Fernando Henrique Cardoso, recém reempossado, ficaria sem nenhuma condição de governar pois sua principal promessa política (que garantira tanto sua eleição quanto sua reeleição), a estabilidade dos preços, teria ido por água abaixo.
Todavia, a partir de meados de março o ambiente começou a clarear. Livre das amarras da âncora cambial, a economia foi mostrando resistência. O Banco Central com Armínio Fraga readquiriu sua credibilidade, o mercado financeiro internacional chancelou o acordo com o FMI e a desvalorização. O fluxo de capitais aos poucos foi sendo retomado. As previsões catastróficas foram-se atenuando e deu-se, até, um início de euforia dos incorrigíveis aplicadores financeiros…
No frigir dos ovos, o ano termina em condições bem melhores do que começou. A inflação, apesar de pressionada no segundo semestre pelo aumento das tarifas, pelos reajustes dos combustíveis e pela procura sazonal de dólares, fechará dentro das metas estabelecidas pelo Banco Central (de 8 a 10%). O dólar, embora ainda alto, deve fechar abaixo de R$ 1,90. A economia deverá ter crescimento zero ou levemente positivo.
No final do ano passado, o presidente Fernando Henrique declarou que “99 será o pior ano dos meus dois mandatos“. De fato, foi um ano difícil para a maioria, embora melhor do que o inicialmente esboçado. O nosso desafio, enquanto país que precisa desesperadamente de desenvolvimento econômico, sob pena de comprometer seu destino unitário e democrático, é aprender com o susto levado em 99 e avançar em 2000. Cada ano que deixamos de crescer de forma sustentável (no mínimo 4%) acentua o nosso drama social, colocando mais lenha na fogueira da insegurança. No C&T da próxima semana, teremos as perspectivas para o ano que vem.