PIOR DO QUE A CRISE É O MEDO DELA

por Francisco Cunha, sócio da TGI Consultoria em Gestão
Desde 1981 já vi três moratórias, inflação de 80% ao mês, confisco do dinheiro. Tudo isso e nem o mundo nem o Brasil se acabaram.
Tenho observado com preocupação a rápida deterioração das expectativas dos agentes econômicos acerca das perspectivas do País nesse início do segundo mandato da presidente Dilma, o chamado Dilma 2. Um inegável quadro de crise.
Outro dia, na coordenação do Comitê de Finanças & Economia da Amcham Recife, do qual sou presidente, tive a oportunidade de assistir a uma excelente palestra de Joaquim Bezerra, CEO da Provider, sobre como as empresas devem lidar com a crise do ponto de vista do cuidado com o caixa etc. e, no final, diante do clima que notei bem puxado para o baixo astral, num auditório cuja idade média era bastante inferior à minha, fiz algumas considerações de quem já tem quase 40 anos de janela nesse tipo de observação.
Desde que me formei em 1981, já vi três moratórias de uma dívida externa “impagável”, a morte de um presidente adoecido no dia anterior à posse, congelamento de preços, a Polícia Federal laçando “boi gordo” no pasto, várias versões de planos econômicos (Cruzado, Cruzado II, Verão, Bresser, Collor, Real), inflação de 80% ao mês (sim, ao mês!), diversas mudanças de moeda (Cruzeiro, Cruzeiro Novo, Cruzado, Cruzado Novo, URV, Real), confisco do dinheiro, impeachment do primeiro presidente diretamente eleito depois de 30 anos de eleições indiretas, crise dos Tigres Asiáticos, do México, da Rússia, da Argentina, o dólar passar de R$ 1 para R$ 4 em poucos dias, juros básicos (Selic) de 40% com inflação de um dígito, crise do subprime, a maior desde 1929…
Tudo isso e nem o mundo nem o Brasil se acabaram. Conseguimos superar a maioria dos problemas e estamos hoje num País com uma economia muitíssimo mais estável do que antes, ainda que um tanto desarrumada. Todavia, nada que seis meses de medidas firmes de ajuste não resolvam. O problema, hoje, é de natureza nitidamente política e de queda crônica de confiança que termina alimentando a gradativa piora das condições econômicas pelo travamento do consumo e do investimento, criando uma espécie de profecia autorrealizante: eu travo o consumo
e o investimento, meu fornecedor não fatura e o fornecedor dele demite…
Sem nenhuma dúvida, temos a obrigação de ser responsáveis e de cuidar com toda a atenção do que precisa ser cuidado mas, por outro lado, também não podemos desesperar porque o medo excessivo da crise é muito pior do que ela mesma.
*Artigo publicado na edição 108 da revista Algomais (www.revistaalgomais.com.br)