Humanos e Urbanos

por Cármen Cardoso, sócia da TGI Consultoria em Gestão
Discutir as tendências para um melhor desenvolvimento das nossas cidades é o desafio dos seus gestores atuais.
Para governantes, gestores, profissionais das questões urbanas e cidadãos, as cidades estão em pauta. Aliás, as cidades sempre tiveram lugar de destaque na história do homem como ser social. Em A Cidade na História – Suas Origens, Transformações e Perspectivas, Lewis Mumford afirma: “Antes da cidade, houve a pequena povoação, o santuário e a aldeia; antes da aldeia, o acampamento, o esconderijo, a caverna, o monte de pedras; e, antes de tudo isso, houve certa predisposição para a vida social […]”.
Essa “predisposição para a vida social”, por mais que tenha mudado ao longo dos diversos milênios de evidência da vida humana e se tornado infinitamente mais complexa, tem movimentos comuns que, mesmo nas mudanças, permanecem como tendência: agrupamento, convivência, trocas, descoberta de meios e formas para lidar coletivamente com as ameaças do mundo externo, de modo a manejar esse mundo, produzir e, até, expressar o intangível nas atividades artísticas e nos rituais.
As vivências associadas a esses movimentos podem ser interpretadas como respostas criativas para se conseguir proteção, defesa, segurança, estabilidade e desenvolvimento, além de expressarem uma busca incessante de respostas para os enigmas da vida (origem, reprodução, morte). As cidades surgiram, na trajetória da evolução humana, como espaços privilegiados para instituir modos de aproximar as pessoas e tornar o intercâmbio de produtos, serviços e informações mais fácil e eficiente.
Mas, além dessas finalidades, a evolução das estruturas de cidade foi determinada, também, por características mais complexas da vida social — as relações de poder; as estratificações de grupos, que criam classes e diferenciais de status; a distribuição de bens e riqueza,*o exercício de direitos individuais e sociais, * a propriedade sobre o território e seus impactos na alocação de recursos e no tipo de uso do território.
No que se refere a essa questão, Benjamin Barber, em entrevista recente, articulou dois autores em tempos históricos bem diversos — Aristóteles (século IV a.C.) e Edward Glaeser (2011) — dizendo que o homem, além de uma espécie política, também é uma espécie urbana. E isso é bastante claro, pois a política se faz possível e viável pela aproximação, pelo intercâmbio e pela negociação. Portanto, a cidade também é o espaço privilegiado da política e para a política, experimentada e traduzida na quase totalidade das questões urbanas.
Temas como democracia, gestão participativa, controle social, distribuição de riquezas, uso inclusivo dos espaços e serviços públicos, exercício da cidadania, direitos coletivos e individuais, instâncias de mediação e qualidade de vida, entre muitos outros, terão que ser debatidos em busca de soluções sempre singulares em função de variáveis psicossociais, históricas e culturais para que a cidade cumpra seu papel essencial de favorecer o desenvolvimento humano.
Este artigo faz parte de uma série de conteúdos que estão sendo produzidos pelo Núcleo de Gestão de Cidades do Instituto da Gestão (INTG), com o objetivo de discutir a forma como as cidades do mundo atual — sejam pequenas, médias, grandes, metrópoles ou megalópoles —, em especial as brasileiras, concentram, de modo definitivo, os desafios e as possibilidades de resolver, pela melhoria de suas gestões, temas e contradições que definem o quanto poderão ser, ou não, favorecedoras desse desenvolvimento.